Fusíveis

“Lei de Byrne: Em qualquer circuito elétrico, os equipamentos e a fiação queimarão primeiro do que os fusíveis.”

Robert Byrne

Fusíveis se encontram em equipamentos elétricos, instalações industriais, instalações residenciais, e em sistemas de distribuição para proteção contra curtos-circuitos e sobrecorrentes elétricas. Por isso, são os dispositivos elétricos mais conhecidos e populares pelo público em geral.

O aumento anormal da corrente elétrica em equipamentos eletroeletrônicos pode provocar o derretimento do condutor e incêndios catastróficos.

Além disso, descargas atmosféricas produzem elevadas correntes induzidas em linhas de transmissão, linhas telefônicas e instalações elétricas.

Esses dispositivos, simples e baratos, possuem funcionamento complexo que envolve aspectos elétricos, mecânicos e térmicos.

Os fusíveis consistem basicamente em pequenos pedaços de material condutor de eletricidade dimensionados para suportar até determinada corrente e fundir sempre que esse valor for ultrapassado.

Eles são projetados para interromper rapidamente correntes elevadas, minimizando a energia dissipada e, consequentemente, os riscos de incêndio e outros danos. 

Essas características resultaram em dispositivos pequenos e baratos. Porém, a sua destruição ao funcionar requer a manutenção de estoque para que o sistema volte a funcionar rapidamente. Esse inconveniente resultou no desenvolvimento de disjuntores, que são mais caros e volumosos.

História dos Fusíveis

Conforme visto nas experiências Temperatura e a Resistência Elétrica, Efeitos Termomecânicos da Corrente, e Fusíveis, a corrente elétrica nos condutores metálicos produz aquecimento e a resistividade desses materiais aumenta com a temperatura.

Em 1883, William Henry Preece publicou o primeiro trabalho que relaciona a corrente de fusão de um condutor metálico com seu diâmetro.

Preece, ex-aluno de Faraday, se tornou engenheiro-chefe dos correios Britânicos e a rede de telégrafos com fio se mostrou muito sensível às descargas atmosféricas.

Portanto, ele se envolveu com o problema de proteger a rede de telégrafos contra sobrecorrentes.

Diversos dispositivos de proteção surgiram, mas todos esbarravam na questão de qual a corrente máxima suportável.

Estes dispositivos deveriam suportar as correntes normais dos telégrafos, mas precisam fundir com as sobrecorrentes. Nascia a ideia do fusível. 1

Preece realizou diversas experiências com fios de diversos materiais, diâmetros e comprimentos.

Além disso, os condutores estavam livres no espaço de tal forma que não houvesse impedimentos para a transferência de calor.

Primeiramente, ele constatou que, descontado o efeito de resfriamento dos terminais2, a corrente de fusão permanecia a mesma independentemente do comprimento dos fios. 

Figura 1. Imagem térmica do fusível de fio

A independência do comprimento contraria o senso comum, mas se mostrou teoricamente correta. Porém, a corrente de fusão dependia do diâmetro e do material.

Além disso, Preece observou que o ponto de ocorrência da fusão variava, e atribuiu este comportamento a irregularidades nos fios.

Inicialmente, ele utilizou fios de Platina, Cobre, Prata e Ferro de diversos diâmetros, mas todos com o mesmo comprimento.

Analisando os dados medidos, Preece constatou que a Equação 1 fornecia a corrente de fusão do fio, e a constante a dependia do material.

Equação 1. Fórmula de Preece

Onde:

    • I é a corrente [A];
    • a é a constante de Preece [A/mm3/2];
    • d é o diâmetro do fio [mm].

Análise Teórica

 

Para que a temperatura no fio se estabilize, a energia elétrica dissipada pelo condutor (P) deve se igualar à energia térmica transferida do fio para o meio exterior (q), conforme a Equação 2 e a Figura 1.
Figura 1. Modelo do fio
Equação 2. Balanço de potência no fio.

Onde:

    • P é a potência elétrica dissipada no fio [W];
    • R é a resistência elétrica do fio [Ω};
    • I é a corrente elétrica no fio [A];
    • q é o calor dissipado pelo fio para o meio ambiente [W];

A Equação 3 mostra que o calor transferido do fio para o ar (q) depende do diâmetro do fio (d), do comprimento do fio (L), e da densidade de energia dissipada (h).

Equação 3.  Calor dissipado pelo fio

Onde:

    • q é a potência dissipada pelo fio [W];
    • h é fluxo de calor dissipado por área do fio [W/m2];
    • d é o diâmetro do fio [m];
    • L é o comprimento do fio [m].

Como a descoberta de Peerce ocorreu 7 anos antes dos resultados de Drude, ele não relacionou sua constante com a resistividade, apesar de identificar sua relação com as dimensões e tipos de materiais.

Considerando a resistividade elétrica do fio, a Equação 4 fornece o valor da resistência em função das dimensões do fio.

Equação 4. Resistência elétrica

Onde:

    • R é a resistência elétrica do fio[Ω];
    • ρ é a resistividade elétrica do fio [Ω.m];
    • L é o comprimento do fio[m];
    • A é a área da seção reta do fio[m2].
    • d é o diâmetro do fio [m]

Substituindo as Equações 3 e 4 na Equação 2, obtém-se que:

Equação 5.

Observa-se que a Equação 5 permite determinar a constante de Peerce da seguinte maneira:

Equação 6. Constante de Peerce

A Equação 6 mostra que a constante de Peerce depende da resistividade elétrica do material e do fluxo de calor dissipado pela área superficial do fio.

A resistividade elétrica já foi devidamente analisada no capítulo de Condutividade e Resistividade I, mas a densidade de calor dissipado requer algumas considerações.

Supondo que a transferência de calor do fio para o meio ambiente ocorra apenas por Radiação Térmica, pode-se aplicar a Lei de Stefan-Boltzmann. 3

A partir da Lei de Stefan-Boltzmann, a Equação 7 fornece o fluxo de calor no fio.

Equação 7. Fluxo de calor no fio devido à radiação térmica

Onde: 

    • h é fluxo de calor dissipado por área do fio [W/m2 ];
    • σ é a constante de Stefan-Boltzmann [5,670 373 e-8 W/(m2 K4)];
    • T é a temperatura de equilíbrio do fio [K]

Substituindo a Equação 7 na Equação 6, obtemos a seguinte expressão:

Equação 8. Constante de Preece

Onde:

    • a é a constante de Peerce [A.m -3/2];
    • T é a temperatura no fio [K];
    • σ é a constante de Stefan-Boltzmann [ 5,670 373 e-8 W/(m2 K4)];
    • ρ é a resistividade elétrica do fio [Ω.m];

Observa-se que a constante de Preece varia com o quadrado da temperatura do fio e, conforme visto anteriormente, a resistividade elétrica dos materiais também depende da temperatura.

Contudo, as temperaturas notáveis; temperatura de fusão, temperatura de ebulição e ponto de Drapper, apresentam valores bem definidos.

Por isso, Preece determinou seu coeficiente para a temperatura de fusão dos materiais porque os fios sempre rompem nessa temperatura.

A Tabela abaixo apresenta o coeficiente de Preece de diversos metais utilizados como condutores na engenharia elétrica.

A liga de Estanho e Chumbo, muito utilizada para soldar componentes eletrônicos e funcionar como fusível, apresenta dados pouco precisos porque as propriedades das ligas dependem do percentual de sua composição de cada elemento que as constitui.

Coeficiente de Preece

wdt_ID Material Coeficiente de Preece(A/cm^3/2) Temperatura de Fusão (C) Condutividade Elétrica (MS/m)
1 Cobre 2,531 1.084,62 59,00
2 Alumínio 1,874 660,32 38,00
3 Platina 1,278 1.768,30 9,40
4 Prata 1,292 961,78 62,00
5 Ferro 0,778 1.538,00 10,00
6 Estanho 0,406 231,93 9,10
7 Estanho/Chumbo (solda) 0,326 183,00 5,00
8 Chumbo 0,341 327,46 4,80

Fontes: Ness Engineering Inc , Propiedades da Solda e Tabela Periódica

Referências

  1. CHEN, K. C.; WARNE, K. L.; LIN, Y. T.; et al. Conductor fusing and gapping for bond wires, Progress In Electromagnetics Research M, vol.31,199-214,2013.
  2. JOHNS, A.T., WARNE, D.F., Electric Fuses, IET, 2008.
  3. PREECE, W. H., On the heating effects of electric currents, Proc. R. Soc. Lond, 36, p. 464-471, publicado em 1 jan. 1883.
  4. PREECE, W. H., On the heating effects of electric currents II, Proc. R. Soc. Lond, 43, p. 280-295, publicado em 1 janeiro 1887.