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Subsídio Nuclear

JOAQUIM FRANCISCO DE CARVALHO e
ILDO LUÍS SAUER


No livro “La vérité sur le nucléaire” (Éditions Albin Michel, 2011), a ex-ministra francesa do Meio Ambiente Corinne Lepage revela que os custos da energia gerada em centrais nucleares são altamente subvencionados pelo estado e que tudo o que é divulgado a respeito disso vem revestido de dissimulações e meias-verdades. Também no Brasil os custos da energia nuclear são subvencionados de forma decisiva pelo estado, ou seja, pelos contribuintes — e as estatais do setor tudo fazem para dissimular este fato.

O Brasil dispõe de fontes energéticas muito mais econômicas do que o urânio, que, ademais, são renováveis e não oferecem riscos de acidentes catastróficos como os de Chernobyl e Fukushima. Entretanto, alguns funcionários de estatais argumentam que as usinas nucleares são indispensáveis “para aproveitar as 309.000 toneladas de minério de urânio existentes no Brasil”. A nosso ver, usar esse urânio para gerar eletricidade seria o mesmo que começar a fumar (mesmo sabendo que esse vício é letal) só porque um comerciante oferece cigarros de graça...

Mediante o aproveitamento de seu inigualável potencial energético renovável (energias hidrelétrica, eólica, fotovoltaica etc.), o Brasil poderia se transformar no primeiro grande país do mundo a ter um sistema elétrico inteiramente sustentável, vantagem que colocaria a indústria brasileira entre as mais competitivas do mundo. O governo desperdiçará esta vantagem caso venha a optar pelas onerosas centrais nucleares e termelétricas convencionais.

Se o retorno dos investimentos não for subvencionado e as despesas de administraçã dos rejeitos radiativos não forem dissimuladas, o custo da energia das centrais nucleares brasileiras será de, no mínimo, R$ 190/MWh (V. “Custo da energia elétrica”, em http://www.ilumina.org.br). Isto significa que investimentos em usinas nucleares produzem metade do beneficio que seria obtido com investimentos em hidrelétricas e eólicas, que geram eletricidade a aproximadamente R$ 100/MWh e ainda têm
as vantagens de serem sustentáveis, criarem mais empregos e não oferecerem riscos de acidentes catastróficos.

Considerando-se o potencial hidrelétrico levantado pela Empresa de Pesquisa Energética e o potencial eólico, levantado pelo Centro de Pesquisas em Energia Elétrica da Eletrobrás, vê-se que um sistema interligado hidroeólico teria capacidade suficiente para oferecer eletricidade à população brasileira em escala comparável à de países de alto nível de qualidade de vida, como aFrança, a Alemanha e a Grã-Bretanha.

A reserva de segurança do sistema hidroeólico seria constituída pelas termelétricas a gás já existentes nas diversas regiões do país, que seriam acionadas apenas nos raros períodos hidroeólicos críticos, com mínimo impacto sobre o custo da energia produzida pelo sistema interligado.

Portanto, ao contrário de alguns países europeus e do Japão, que ainda não têm melhor alternativa, o Brasil não precisa correr o risco de gerar em centrais nucleares a energia elétrica que consome.

JOAQUIM FRANCISCO DE CARVALHO é pesquisador associado ao Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo.
ILDO LUÍS SAUER é diretor do Instituto de Eletrotécnica e Energia.

Publicado no Jornal O Globo no dia 23/11/2011